quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Treinamentos comportamental e técnico andam juntos

Treinamentos comportamental e técnico andam juntos

31 de janeiro de 2008 às 00:05
Portal e-Learning Brasil

Uma das jornalistas mais conhecidas do país tinha um grande medo: fobia de avião. No ano passado, Fátima Bernardes admitiu que precisou passar por um trabalho com abordagem comportamental para superar o pânico, adquirido quando engravidou de seus três filhos. Este foi um típico caso de limitação pessoal que chegou a atrapalhar a vida profissional da jornalista: como não conseguia voar, suas tarefas de apuração de notícias à frente do Jornal Nacional ficaram comprometidas. Somente em 2002 ela viajou pela primeira vez curada da fobia, ao cobrir a Copa do Japão.O caso da jornalista ilustra uma das benesses da chamada abordagem comportamental. Introduzida em 1947 nos Estados Unidos, a teoria admite que os aspectos comportamentais influenciam a capacidade motivacional dos colaboradores. Logo a seguir, começaram a surgir treinamentos voltados para esta realidade, que se propunham a melhorar características de comportamento para que a motivação para o trabalho crescesse. No caso da jornalista, apesar de não ter passado exatamente por um treinamento, foi este estilo de abordagem que melhorou uma limitação que atrapalhava seu trabalho. O mesmo vale para executivos que precisam desenvolver características como auto-estima, comunicação, timidez etc.Porém, a aplicação de técnicas e treinamentos comportamentais não deve nem pode substituir abordagens mais tradicionais, a exemplo dos eventos de atualização técnica. Na Yamaha, por exemplo, os dois andaram juntos por um período de nove meses, quando a empresa descobriu que seus funcionários precisavam se conhecer melhor. De acordo com o CEO da consultoria Thomas International, Victor Martinez, responsável pela condução do processo, com o passar do tempo, à medida que as devolutivas dos colaboradores sobre o curso comportamental eram coletadas, pôde-se perceber que havia algumas carências de atualização técnica que podiam ser melhoradas a partir de mudanças de conduta. E vice-versa.Na verdade, em muitas ocasiões é mais importante para um executivo saber se relacionar ou superar limitações sociais, que, propriamente, absorver muitos conhecimentos técnicos sobre um determinado assunto. “Quando você vai avançando na hierarquia da empresa, precisa dominar com mais intensidade os aspectos comportamentais”, diz o CEO. É assim que executivos conseguem mudar de cargos gerenciais entre companhias de segmentos diferentes sem prejuízo da função. Martinez acredita que os aspectos técnicos costumam ser aprendidos com mais facilidade, porém é muito mais complicado fazer um tímido aprender a ser extrovertido, por exemplo.HabilidadesFoi dessa forma que, durante o treinamento aplicado pela Yamaha, os consultores trabalharam no sentido de identificar outras necessidades além do auto-conhecimento. A empresa, então, se deu conta de que havia demandas de caráter técnico que precisavam ser supridas em conjunto com as habilidades emocionais. O que era um treinamento de poucas semanas se estendeu para os nove meses, sendo que a Yamaha optou por aplicar tanto uma atualização técnica quanto comportamental. Empresas como a Klabin, por exemplo, já de saída, aplicam os dois tipos de treinamento em conjunto e continuamente com funcionários recém-admitidos, principalmente nos processos de contratação de trainees.O treinamento comportamental vem sendo amplamente utilizado em casos como estes, tentando desenvolver habilidades que estão latentes em cada executivo. Porém, não deve ser visto como milagroso nem completamente relegado a segundo plano. Dessa forma, o ideal é dosar e equilibrar a aplicação dos dois tipos de abordagem (técnica e comportamental) até porque, na verdade, uma pode apontar deficiências que seriam resolvidas pela outra. Um facilitador tem condições de perceber, durante um workshop de atualização profissional, que os colaboradores têm problemas para se comunicar uns com os outros e sugerir um trabalho para melhorar essa habilidade.Entretanto, a preocupação com a abordagem comportamental costuma ser rara. Em grandes empresas (que representam a minoria no país), este é um compromisso que está na agenda há apenas três anos, diz Martinez. Nas médias, os treinamentos comportamentais só atingiram 60% delas, enquanto muitas pequenas ainda nem têm noção da importância ou até mesmo do que seja esse tipo de projeto. Boa parte das últimas, ao atualizarem as competências dos seus funcionários, não transporta o potencial desenvolvido para o dia-a-dia, tornando inútil o conhecimento adquirido pelo colaborador.Estímulo na práticaDavid Carlessi, consultor do instituto de treinamento Idort/SP, explica que a abordagem comportamental, por si só, já é um grande catalisador de mudanças dentro da companhia, mas, quando o ambiente de trabalho castra as modificações sugeridas, podem surgir ainda mais problemas. “O treinamento mexe com o jeito como a pessoa é e não pode vir desvinculado de mudanças na própria forma como a empresa trata seus empregados”, explica ele. Ou seja, estimular um gerente a desenvolver a capacidade de liderança, mas podá-lo constantemente, a longo prazo, causa desmotivação e leva este funcionário a se afastar da empresa, por exemplo.Por isso que, antes de provocar a mudança comportamental na organização, Carlessi aconselha um estudo prévio e identificação de competências a serem incutidas nos perfis de cada profissional. Depois disso, o trabalho continua com a implantação de coaching para que as modificações realmente façam efeito entre os funcionários. Porém, não basta aplicar um treinamento comportamental apenas uma vez: ele deve ser constantemente reforçado até que os colaboradores incorporem as características propostas pelo treinamento. E mais, a partir do momento em que se trabalha com base no comportamento, é preciso admitir que todo indivíduo é um tomador de decisões, autônomo, que se comporta buscando soluções satisfatórias para sua vida.Antes de provocar mudanças, portanto, é preciso estar preparado para elas. Esse foi o caso da Unimed Nacional, que aplicou um treinamento de gestão de tempo para seus colaboradores e retirou do encontro várias idéias sugeridas por sua equipe de atendimento. “Esse foi um dos casos em que eu percebi que a empresa realmente estava interessada não apenas em mudar, mas também em saber como acompanhar de forma eficiente as mudanças de comportamento de seus funcionários”, diz Carlessi.

Seja você mesmo. (matéria publicada na Revista IstoÉ de setembro de 2000)

Seja você mesmo

A ordem do dia nas empresas é abrir espaço para as particularidades de cada funcionário. Saiba por que você deve aproveitar e se mostrar exatamente do jeito que é.

Por Juliana De Mari

Uma vez por ano, chefes e subordinados da Asea Brown Boveri - ABB - passam uma semana sentados lado a lado, falando, falando e falando. O que eles tanto discutem? Nada que tenha a ver com os negócios milionários da gigante mundial em engenharia e tecnologia. Nesses encontros, sempre fora da empresa, eles só abrem a boca para falar de si mesmos. Em alto e bom som, revelam aos colegas como se autodefinem, como acreditam que os outros os vêem, como reagem às coisas da vida. Falam da infância, de seus medos e de suas ambições. Invariavelmente, choram. A atividade faz parte do programa Insight, cujo objetivo é trazer à tona as diferenças de comportamento entre os quase 3 000 funcionários da filial brasileira. Mas por que a empresa decidiu mexer num vespeiro como esse? "Porque é só assim que teremos um ambiente de trabalho verdadeiramente satisfatório", acredita Osvaldo Esteves, diretor de RH da ABB. "Não basta dar suporte para o desenvolvimento técnico das pessoas. É fundamental entender a personalidade delas para buscar a melhor forma de mantê-las comprometidas."
Até alguns anos atrás, esse discurso soaria como um pomposo blablablá sem implicação prática alguma na sua vida profissional. Encontros do tipo dos promovidos pela ABB estariam restritos às dinâmicas de grupo no psicológo - e olhe lá, dirá você. No mundo corporativo, um acontecimento como esse seria tachado de, no mínimo, insano e piegas. Pura perda de tempo. É, como se vê, o ambiente de trabalho está realmente mudando. Hoje, essa espécie de atividade não só é levada a sério como está se transformando numa importante vantagem competitiva - ao menos é o que acreditam os especialistas. O chamado treinamento comportamental é a ponta-de-lança de uma mudança cultural que tem sacudido as empresas. Mais do que nunca, para ser realmente eficientes, as organizações têm de lidar com as diferenças. Isso significa dar espaço à diversidade - e não estamos falando apenas de ter pessoas de raça, sexo e religião diferentes trabalhando num mesmo lugar. Trata-se de ir além e respeitar as particularidades da personalidade e do estilo de vida de cada um dos profissionais. Esse é um desafio que veio com a globalização e está aí para ficar.
E por que você deve comemorar? Porque aqui está aquela oportunidade com a qual é bem provável que você tenha sonhado desde o primeiro emprego - a chance de ser no trabalho exatamente quem você é fora dele. Trocando em miúdos, é o seguinte: daqui por diante, quanto mais espontâneo você for e quanto mais você investir em si próprio como ser humano, maiores serão suas chances de se dar bem. Isso porque, quando assumimos o que nos motiva ou o que nos está chateando, tendemos a realizar nossas tarefas com mais facilidade. Num mercado mais e mais competitivo e que exige respostas cada vez mais rápidas, é ótimo para as empresas trabalhar com essa transparência, porque assim podem ter o maior número possível de perspectivas sobre um mesmo assunto. E é ótimo para você, profissional, porque passa a ser encarado como um ser integral, não apenas como um eficiente fazedor de dinheiro ou um excelente resolvedor de abacaxis. É aquela história que você já conhece. Não basta ser só criativo. Tem de ser ético, bem-humorado e solidário, para citar apenas algumas das características que contam pontos na corrida pelas melhores vagas. Como diz o renomado professor C.K. Prahalad, da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, se você realmente quer fazer a diferença no trabalho, precisa encontrar um caminho único para si mesmo.
É o sinal verde para você levar a alma, o coração e a razão para o ambiente de trabalho. E tudo indica que essa tendência vai se popularizar bem antes do que podemos imaginar. Um levantamento da consultoria Com Ciência Comunicação e Desenvolvimento Pessoal, de São Paulo, mostra que os processos de mudança na gestão das companhias nunca estiveram tão acelerados. Há cinco anos, qualquer mudança cultural levava, em média, 36 meses para passar da intenção à prática. Há dois anos, esse tempo caiu à metade. E, de um ano para cá, os resultados estão aparecendo em apenas nove meses. Segundo os especialistas, esses números são um forte indicativo de que os profissionais estão mais conscientes da importância de ser exatamente quem são no ambiente de trabalho. Os números indicam também que as empresas estão passando, sim, por uma revisão de valores e que estão se empenhando como podem em deixar para trás a mera gestão de mão-de-obra. "Antigamente, o que contava eram os resultados, por isso a ênfase era dada às questões técnicas", explica a psicóloga e consultora de empresas Bene Catanante. "Isso acabou gerando profissionais mascarados, porque pouquíssimas empresas prestavam atenção no processo. Hoje, saber como o processo é conduzido é tão importante quanto saber se ele vai dar certo."
Vestir a máscara de profissional bem-humorado, ético, criativo e globalizado, caprichar no figurino e encarar o chefe está longe de ser uma estratégia recomendável para quem pretende ser bem-sucedido nos dias de hoje. Só funciona se você realmente for uma pessoa assim. "Você tem de agir profissionalmente da forma que agiria em qualquer outra situação da sua vida", ressalta Osvaldo Esteves, diretor de RH da ABB. A universitária paulista Raquel Villa Nova Conceição, de 24 anos, levou esse conceito ao pé da letra. Há quatro anos, recém-contratada para trabalhar no setor de livros jurídicos de uma megastore da rede Saraiva, foi convidada a participar de uma reunião com os diretores do grupo e todos os gerentes de loja (trata-se de uma reunião que acontece mensalmente, sempre com a participação de vendedores, e que tem o objetivo de estimular o entrosamento das equipes). Raquel arriscou um lance ousadíssimo - e se deu muito bem.
Enquanto todos os colegas se derreteram em elogios à Saraiva, Raquel deixou os diretores de queixo caído ao apontar problemas no layout do setor jurídico. Estudante de direito, ela percebeu que a demanda de determinados livros era bem maior do que a oferta na loja. Como se não bastasse ter feito a crítica, pediu licença, abriu um desenho enorme em cima da mesa e listou as mudanças necessárias para solucionar o problema. A proposta dela era mudar tudo: da disposição das prateleiras ao conteúdo. "Sei que me arrisquei, mas eu sempre costumo falar o que penso", afirma ela. "Por que não faria isso justamente para melhorar o meu ambiente de trabalho?" Resultado: 100% das sugestões foram implantadas. Hoje ela é subgerente de uma megastore. Moral da história: Raquel pessoalmente é uma garota simpática, observadora, inquieta e criativa. Teve o devido reconhecimento profissional porque não precisou vender sua idéia numa embalagem falsa.
"É hora de esquecer definitivamente os rótulos e as respostas prontas", acredita Sônia Regina dos Santos, diretora de RH da Saraiva. A rede de livrarias, por exemplo, não tem um manual de atendimento ao cliente. A empresa dá liberdade e investe em programas de motivação para que cada um dos funcionários descubra o jeito mais natural de lidar com a clientela. A filosofia na Saraiva é: quanto maior a diversidade, mais rica a atividade. "Não queremos que as pessoas pensem de maneira igual e nem que se orientem pela vontade dos chefes", afirma Sônia. Fique certo de que empresas como a Saraiva não são tolerantes e benevolentes à toa. O que elas perceberam é que, numa época de disputa por talentos como a que se vive hoje, é fundamental criar um ambiente de trabalho em que todos, sem exceção, tenham vez e voz. "A era da administração coletiva, que tratava os profissionais por classes e fugia dos conflitos individuais, acabou", afirma o headhunter Luiz Carlos de Queirós Cabrera. "Daqui para a frente, a administração de sucesso precisa saber tirar proveito das diferenças."
Esse processo está longe de ser simples. Culturalmente, nem os subordinados, e muito menos os chefes, foram ensinados a lidar com tanta espontaneidade. Mas parece que as coisas costumam ser mais fáceis quando o exemplo vem de cima. Foi em boa parte por causa do jeito autêntico do engenheiro Fernando Terni, presidente da Intelig, que a empresa, concorrente da Embratel, conquistou entre seus funcionários um nível de comprometimento invejável para uma companhia praticamente recém-nascida. Terni é um homem de fala mansa, que presta atenção no que sua intuição diz e que dificilmente é encontrado em sua sala. Não porque esteja fora da empresa, mas porque prefere ir pessoalmente até os subordinados a ficar esperando que alguém o procure. Terni já acudiu um executivo em prantos por causa de uma paixão malsucedida e já chorou na frente de todo seu time lembrando da infância. Nem por isso deixou de ser respeitado. "Acredito que, se você veste uma máscara e exerce um papel com as pessoas, elas fatalmente vão exercer um papel com você - e assim fica difícil aferir quanto de verdade há no jogo", diz. "Prefiro ser eu mesmo e quero saber das pessoas o que elas pensam de verdade, e não o que acham que estou querendo ouvir."
Lembra do caso da ABB citado na abertura deste texto? Curioso para saber o porquê do destaque lá em cima? Não é segredo que a empresa é benchmarking na gestão de pessoas nem que foi uma das primeiras a levar a sério o treinamento comportamental e suas implicações. A ABB, que figura no seleto ranking das dez melhores empresas para trabalhar do GUIA EXAME deste ano, tem a crença genuína de que as pessoas são imprescindíveis para o sucesso do seu negócio. Um outro exemplo, de um profissional também da ABB, vai acabar com a sua possível desconfiança de que essa história toda de dar espaço à diferença é balela. Durante boa parte de seus 20 anos de empresa, o engenheiro eletricista Alberto Wisbeck, de 44 anos, foi tido como o mais frio dos chefes. O temor era tanto que, quando ele apontava no corredor, os funcionários corriam na direção contrária. Embora fosse considerado um grande profissional, estava correndo sério risco de parar na geladeira por causa da imagem negativa que tinha entre seus subordinados.
Foi durante um daqueles treinamentos comportamentais já citados que Wisbeck, gerente-geral de produção e engenharia de transformadores, percebeu o tamanho do abismo que se havia criado entre ele e sua equipe. Foi ali também que ele admitiu que era um homem inibido. Na verdade, inibidíssimo. "Os colegas foram corajosos na hora de falar a verdade e me criticar, e eu me senti vitorioso por ter conseguido fazer as pessoas perceber que aquela minha frieza era reflexo de um medo enorme de não agradar", diz ele. "Aprendi que a gente só tem a ganhar quando abre o coração e se mostra para os outros exatamente do jeito que é." Quando tirou a máscara, Wisbeck não ganhou apenas companhia para o café. No último treinamento realizado pela ABB, no mês passado, ganhou a honra de ser apontado pelos participantes como modelo de liderança. Como se vê, quanto maior a exposição, maior o risco. De fazer "a" diferença.